Saltar para: Post [1], Comentários [2], Pesquisa e Arquivos [3]

ALÉM GUADIANA

Associação Além Guadiana (língua e cultura portuguesas em Olivença): Antigo Terreiro de Santo António, 13. E-06100 OLIVENÇA (Badajoz) / alemguadiana@hotmail.com / alemguadiana.com

ALÉM GUADIANA

Associação Além Guadiana (língua e cultura portuguesas em Olivença): Antigo Terreiro de Santo António, 13. E-06100 OLIVENÇA (Badajoz) / alemguadiana@hotmail.com / alemguadiana.com

Contadôri

Flag Counter

Duas nacionalidades, uma opção pessoal

AG, 22.10.12

DUAS NACIONALIDADES / UMA OPÇÃO PESSOAL

 

Estimados Oliventinos,

A celebração das Lusofonias é sempre motivo de satisfação, de emoções, de sensações, de sentimentos encontrados, para todos aqueles que assim o levam na alma.

            Não podemos esquecer que a língua e cultura portuguesa nos pertence, a nós, aos Oliventinos, essa cultura que tão grande nos tem feito e que ainda tem muito para nos dar.

Palavras de Eduardo Machado          

Além Guadiana, uma associação que recebe amigavelmente todos aqueles que nos queiram apoiar e acompanhar, uma associação que trabalha com naturalidade, transparência, é plural, não temos nada que esconder, a nossa arma é a cultura.

Hoje, para Além Guadiana não é dia de opinar. É dia de aproximar e informar. Por isso consideramos que cada indivíduo é dono dos seus sentimentos. Todos aqueles que queiram exprimi-los, nós Além Guadiana, hoje informamos que têm a oportunidade de optar a duas nacionalidades. Isto não é novidade e prova disso é que já o fizeram vários Oliventinos. Sempre houve essa possibilidade e alguns perguntarão, porquê agora? Agora sim, porque simplesmente é uma vontade que já nos tinham apresentado cidadãos de Olivença há um certo tempo. Mais recentemente têm sido muitos os Oliventinos que nos perguntam pela resposta e nós, a Associação Cultural Além Guadiana, ponderamos que talvez fosse o momento.

Os Oliventinos têm, por direito, a possibilidade de adquirir a nacionalidade portuguesa. O Estado Português faculta essa opcão às pessoas  oriundas dos municípios de Olivenz(ç)a e Táliga, que o solicitarem e que estejam abrangidas pelo  menos por um dos vários requisitos, entre os quais:

- o  parentesco;

- a ascendêcia; ou,

- ser natural do seu território histórico.

Adquirir a nacionalidade portuguesa não supõe ou induz a rejeitar à nacionalidade espanhola. Os Oliventinos estão abrangidos pelas jurisdições, espanhola e portuguesa, ou, portuguesa e espanhola. Não estamos a falar de dupla nacionalidade senão de possuir duas nacionalidades, quer dizer, ser considerado somente espanhol por Espanha e somente Português por Portugal.

No entanto, para muitos oliventinos, conscientes do passado histórico da sua terra e do seu carácter bicultural, adquirir a nacionalidade portuguesa pode ter um valor afectivo, manifestando assim a sua identidade dual.

            Se Fernando Pessoa, escritor sublime da literatura portuguesa espreitasse à porta diria o seguinte: Valeu a pena? Tudo vale a pena se a alma não é pequena.

            A nossa associação volta a salientar que é uma questão de alma e, cada indivíduo tem a sua, é um acto rodeado de simbolismo.

            De tudo falamos, de tudo opinamos mas de nada sabemos, mas acima de tudo sentimos.

            A associação cultural Além Guadiana dentro da convivência, respeita todas as opções de todas as pessoas. Nós não cozinhamos nenhum prato, simplesmente apresentamos a receita e só cozinha e come quem quiser.

            Porém, adquirir a nacionalidade portuguesa, também nos proporciona regalias,  tais que não teriam os súditos de outros países. Assim, existe maior facilidade de acesso a determinados serviços públicos, à universidade, etc, e principalmente ser português em Portugal e no mundo. Além disso, Portugal pertence à CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa), entre os quais se encontram alguns dos principais países emergentes no mundo, como Angola e Brasil, por outras palavras, existem múltiples acordos, podendo usufruir de estes convénios os cidadãos aderentes, o que não podem fazer indivíduos de outras nacionalidades.

Em Olivença, actualmente, há pessoas que ostentam as duas nacionalidades, espanhola e portuguesa, bem sejam aqueles que procedem de Portugal e que adquiriram a espanhola ou os naturais de Olivença que adquiriram a portuguesa. Em nemhum  caso se produzem sentimentos opostos com a sua outra nacionalidade,  nem instigam problemas ou transtornos de tipo algum. Tudo pelo contrário, isto permite desfrutar das diversas vantagens e viver com normalidade como cualquer outro cidadão Oliventino. Por outras palavras, uma condição que será uma mais valia.

Agora, vou expressar um sentimento pessoal. Eu, Eduardo, sou mais um desses milhares de cidadãos de Olivença. Nunca quis ser exemplo de nada, mas hoje mais do que nunca talvez o meu exemplo possa dissipar pensamentos errôneos, mal intencionados ou confusos. Com o permisso da minha família desejo expor o seguinte: sou filho de uma sevilhana, filho de um português de Corgas, uma freguesia de Seia, marido de uma oliventina, pai de oliventina, neto de um extremenho e de portugueses. Tenho tios americanos, chilenos, ingleses, primo nascido na Bégica e naturalizado estadunidense, primos nascidos em Moçambique e com nacionalidade portuguesa. Nunca na minha família houve choques culturais. A minha mulher é oliventina, de ascendência portuguesa por parte paterna e eu nunca lhe perguntei se quería optar pela nacionalidade portuguesa,  a minha filha tem as duas nacionalidades, mas o caso mais singular é o do meu pai que com uma certa idade e sempre com nacionalidade portuguesa neste momento está a tramitar a nacionalidade espanhola. Portanto, na nossa família não há caso “nacionalidade”. O que podemos falar é de sentimentos, nunca me perguntem qual é a minha primeira opção. Eu não tenho dúvidas, eu tenho duas nacionalidades e dois sentimentos. O meu sentimento é a minha língua, na língua em que eu me expresso é a que representa o meu sentimento e eu tenho todas as raízes e a cultura associada à lingua que falo nesse momento, eu não acredito no iberismo mas sim na convivência das culturas. Curiosamente em Olivença sou conhecido por Eduardo “El Portugués” e em Portugal por Eduardo “O Espanhol” e nunca me enfadei por tal motivo, tudo pelo contrário, é para mim grande honra e orgulho poder ser identificado por algo diferente, a cultura. Nunca me façam escolher entre o meu pai e a minha mãe.  Acima de tudo sou oliventino, mas com especificidades que às vezes podem não ter explicação, coisa que não é estranha em Olivença.

Sendo eu um viageiro empedernido podía apresentar um sem-fim de ocorrências, mas há uma que eu quero comentar, numa viagem que fiz com a minha família em 2009, no Iguaçú, do lado argentino, contratei os serviços de um carro com chofer. Este chofer, senhor Daniel, tinha nacionalidade argentina, de mãe brasileira e pai paraguaio. Mas ele identificava-se como Guarani, essas eram as verdadeiras raízes do Daniel. O senhor Daniel quando mais feliz se sentia era quando levava alguém a um lugar chamado “as três fronteiras”, era para ele não a junção dos territórios mas sim das culturas, a história constantemente se repete.

Gostava de citar a um grande escritor moçambicano, filho de Portugueses, Mia Couto. Eu aconselhava a todos vós a ler alguns livros dele donde poderão observar onde o autor reivindica, a Moçambicaneidade, os valores do passado do seu povo mas que durante quinhentos anos foi colonizado pelos portugueses, tenta recriar a língua portuguesa com uma influência moçambicana, utilizando o léxico de várias regiões do país e produzindo um novo modelo de narrativa africana.  Ele visualiza muito bem como a historia foi mal vendida aos africanos e a percepção errônea que os europeos temos de África. Eu não afirmo nada mas com este exemplo de Mia Couto deixo uma pregunta no ar,  será o caso de Olivença? Com isto quero dizer que não é maligno informar. Mas  sim temos o dever de esclarecer e depois que cada um opte por aquilo que ele considere melhor.

 A tradição é cultura e a fusão das culturas será sempre enriquecedora. 

Não obstante, a principal razão pela qual muitos Oliventinos desejam adquirir as duas nacionalidades é pelo simbolismo que representa, sendo a melhor forma  de identificar a dualidade que caracteriza a nossa terra. De una maneira evidente e através dos próprios conterrâneos, dá-se assim a visibilidade a essa singularidade de Olivença na península ibérica, com uma grande projeção em todos aspectos.

A palavra imortaliza a cultura, mas não  basta só dizer que temos duas culturas, é preciso transpor as barreiras e o futuro de Olivença passa por ser bilingue e  bicultural. Não teria sentido que os oliventinos que sentirem essa biculturalidade fossem privados de conhecer uma possiblidade que a lei os ampara. Possivelmente, essa biculturalidade real, e não uma mera  abstração, possa constituir o principal recurso económico da nossa terra no futuro. Trabalhar para tornar a realidade nessa dualidade cultural e transformar Olivença num lugar de referência, requer de uma consciência sobre o valor do que somos e do que temos, assim como o apoio decidido das instituições, e dos cidadãos, valorizando a nossa relevante herança portuguesa nos seus aspectos etnográficos, monumentais, históricos, etc., e, acima de tudo uma aposta no bilinguismo.

Há textos sobre Olivenz(ç)a escritos por oliventinos e por forâneos. Há referências bibliográficas de Olivenza com Z e outras com Ç. Há tantas publicacões editadas sobre Olivenza em língua castelhana como em língua portuguesa. Ultimamente, começam a aparecer livros bilingues, em castelhano e em português, é um reconhecimento à nossa dualidade cultural.

Na nossa cidade podemos encontrar os nomes das ruas em espanhol e em português.

Na nossa Associação Cultural, Além Guadiana, estamos convencidos de que Olivenz(ç)a podía ser un paraíso, um paraíso cultural. São numerosas as actividades desenvolvidas desde aquelas I Jornadas sobre o Português Oliventino até hoje, passando pela edicão anual das Lusofonias, noites de fados, cursos de português, colaboracões com a comunidade educativa, etc. Com o apoio da Câmara Municipal e da Universidade da Extremadura, estamos a realizar o  estudo e compilacão do Português Oliventino, un banco de dados sonoro, que será a memória da nossa língua portuguesa.

O nosso esforço é árduo mas não é suficiente, isto peretence a todos nós, é preciso a sensibilização e o contributo dos cidadãos, das instituições, até das empresas, para tornar visível a parte más fraca da nossa cultura, que pouco a pouco estava a vestir uma pijama de madeira, a morte.

Há um crescente interesse pelo portugués no mundo, estamos a viver o “boom” do português e está a crescer como bloco cultural e linguístico. Acreditamos que o português nunca esteve em tão boa forma e a tendência é para crescer e crescer muito, o português é uma língua que tem valor económico e temos que aproveitar o momento económico e político para concretizar os outros lucros.

No espaço da lusofonia há várias línguas em português e não apenas a «variante» do Português Oliventino, é muito rico falarmos a mesma língua e pertencermos a diferentes matrizes culturais.

A percepção que temos é de que a língua portuguesa está em grande crescimento, não apenas pelo movimento demográfico nos países onde é língua oficial, mas sobretudo como segunda língua e como língua estrangeira.

 Hoje em dia estamos muitas vezes sob o signo da economia, mas é preciso dizer, até para reforçar a importância da cultura, que também a cultura tem um valor económico cada vez mais importante.

 Não estamos numa guerra das línguas, mas certamente numa afirmação da diversidade linguística e cultural.

Olivenz(ç)a pode e deve ser referente.

Não podemos esquecer que Portugal, é a nação com as fronteiras mais antigas do mundo e nós somos em Olivenz(ç)a tão especiais que não temos marcos fronteiriços, e Portugal participa em todos os movimentos literários, começando na lírica galaico-portuguesa e acabando no modernismo. Também é de salientar que foi um reino poderoso e glorioso fruto de uma expansão ultrmarina na qual muitos oliventinos participaram, por exemplo, Frei Henrique de Coimbra Bispo de Ceuta e, que participa na primeira missa no Brasil, por outro lado os Gamas, etc.

A existência de uma comunidade de Oliventinos portadores de ambas nacionalidades permite-nos, por sua vez, legitimar ainda mais a petição de apoio económico ou logístico, a Portugal por diversas matérias, realçando o ensino da língua de Camões e da cultura portuguesa, não devemos olvidar que a língua portuguesa é a quinta mais falada na terra, e já é a segunda língua românica com maior número de falantes no mundo, uma das línguas com maior oportunidade de futuro,  encontrando-nos num mundo global, tendo uma enorme trascendência estratégica, nas relacões comerciais, empresariais, turísticas, etc., fundamentais para o desenvolvimento de Olivenz(ç)a.

No contexto da emergência dos países  lusófonos e de maior aproximição entre os mundos luso e hispanofalantes, são cada vez mais as instituciões educativas que oferecem a língua de Camões aos seus alunos, assim como as empresas que solicitam  profissionais com estudos de português.

Num mundo em que cada vez é maior a exigência das línguas estrangeiras e devido também ao crescente interesse pelo estudo da língua e cultura portuguesa  Olivenz(ç)a não deve perder a oportunidade de ser a referência na Península Ibérica nesta matéria.

            Há muito tempo que dizemos que Olivenz(ç)a está tão perto mas ao mesmo tempo tão longe, provavelmente a partir de hoje se possa dizer que estávamos tão longe e cada vez mais próximos.

            Albert Camus  dizia: o que conta não é o que se diz, senão o que não é necessário dizer. Esperemos não ter que voltar a recordar esta conversa.

            E para concluir, considerando Além Guadiana que o bilingüismo e o biculturalismo é fundamental,  vou recitar dois poemas de dois grandes da literatura e assim aproveito para abrir a leitura pública:

 

Caminhante, são teus rastos                         

o caminho, e nada mais;                               

caminhante, não há caminho,                       

faz-se caminho ao andar.                              

Ao andar faz-se o caminho,                          

e ao olhar-se para trás                                   

vê-se a senda que jamais                               

se há-de voltar a pisar.                                  

Caminhante, não há caminho,                      

somente sulcos no mar.                                 

 

Antonio Machado

 

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,

Muda-se o ser, muda-se a confiança;

Todo o mundo é composto de mudança,

Tomando sempre novas qualidades.

 

Continuamente vemos novidades,

Diferentes em tudo da esperança;

Do mal ficam as mágoas na lembrança,

E do bem, se algum houve, as saudades

 

Luís Vaz de Camões

 

 

ECOS:

http://www.tvi.iol.pt/videos/programa/4529/128762 (aos 66:22 minutos)

 

 

1 comentário

Comentar post